News Tributário Nº 864

22/03/2024 em News Tributário

Tributação de FIs de Renda Fixa Fechados e FIAs na Hipótese de Doação em Adiantamento de Legítima e Sucessão Causa Mortis

No dia 18.03.2024, foi publicada no Diário Oficial da União (“D.O.U.”) a Solução de Consulta da Coordenação-Geral de Tributação da Receita Federal (“COSIT”) nº 21, de 14.03.2024 (“SC COSIT nº 21/2024”), por meio da qual as Autoridades Fiscais avaliaram o tratamento tributário aplicável à transferência, em decorrência de sucessão por herança, legado ou de doação em adiantamento da legítima, de cotas de fundos de investimento em renda fixa (“FIs Renda Fixa”) e de Fundos de Investimento em Ações (“FIAs”), constituídos sob a forma de condomínio fechado (“FIs Renda Fixa Fechados” e “FIAs Fechados”, respectivamente), titularizadas por cotista pessoa física residente ou domiciliado no Brasil.

Neste contexto, a COSIT expressou o entendimento de que:

• tais transferências de cotas de FIs Renda Fixa Fechados/FIAs Fechados são consideradas uma modalidade de “alienação” para fins da incidência do Imposto sobre a Renda (“IR”), na forma do artigo 46, parágrafo 2º, da Instrução Normativa da Receita Federal do Brasil (“RFB”) nº 1.585, de 31.08.2015 (“IN RFB nº 1.585/2015”);

• por se tratar de alienações realizadas fora do ambiente bursátil, sua tributação pelo IR deveria ocorrer na forma do artigo 21, incisos I a IV da Lei nº 8.981, de 20.01.1995 (“Lei nº 8.981/1995”), incidindo o IR sobre o ganho de capital às “Alíquotas Progressivas” de 15% (quinze por cento) a 22,5% (vinte e dois e meio por cento), a depender do valor do ganho auferido, sendo a instituição administradora do fundo, ou a instituição que intermediar recursos por conta e ordem de seus respectivos clientes (no caso de aplicações em fundos de investimento administrados por outra instituição), responsável pela retenção e recolhimento do IR (em linha com o artigo 17 da IN RFB nº 1.585/2015);

• em tais hipóteses, segundo o entendimento da COSIT, fica afastada a aplicabilidade da regra de apuração de ganho de capital contida no artigo 23 da Lei nº 9.532, de 10.12.1997 (“Lei nº 9.532/1997”)[¹], devendo-se avaliar o valor das cotas, para fins de apuração do ganho de capital decorrente destes eventos, com base em seu valor de mercado, aplicando-se, para fins de cálculo do IR incidente sobre os referidos ganhos, as Alíquotas Progressivas em função do valor do ganho;

• para afastar a aplicação do artigo 23 da Lei nº 9.532/1997, a COSIT desenvolveu o racional de que a finalidade visada pelo legislador ao criar este dispositivo teria sido a de evitar a evasão/não recolhimento do imposto devido quando da transferência via herança, legado ou doação em adiantamento de legitima, sem, no entanto, forçar os herdeiros ou doadores a alienar outros bens (que não os transferidos) para poderem fazer face ao IR no pagamento no ato de transferência; contudo, tendo em vista que, segundo a COSIT, os FIs Renda Fixa Fechados e FIA Fechados possuiriam, em seu ativo, instrumentos financeiros dotados de liquidez suficiente para serem alienados (em mercado secundário), de forma a permitir que seus cotistas façam face ao pagamento do IR devido, não haveria justificativa teleológica para aplicação do referido dispositivo aos casos de transferência de cotas de fundos de investimento, ainda que via herança, legado ou doação em adiantamento de legítima;

• com isso, a SC COSIT nº 21/2024 reformou a Solução de Consulta COSIT nº 98, de 21.06.2021 (“SC COSIT nº 98/2021”), que havia anteriormente tratado da incidência do IR sobre doação em adiantamento de legítima de cotas de FIA Fechado, entendendo pela aplicabilidade a esses eventos do artigo 23 da Lei nº 9532/1997, de tal modo que, no que se refere à apuração do ganho de capital respectivo, seria possível adotar como valor de alienação/transferência das cotas do FIA Fechado ora o valor constante da declaração de bens do doador, ora o valor de mercado das referidas cotas, conforme faculdade do contribuinte, recaindo, na hipótese de eventual ganho de capital, a responsabilidade pela retenção e recolhimento do IR devido sobre o próprio contribuinte (via auto recolhimento);

• ademais, a SC COSIT nº 21/2024 também reformou, embora neste caso apenas parcialmente, a Solução de Consulta COSIT nº 383, de 26.12.2014 (“SC COSIT nº 383/2014”), que havia anteriormente tratado da incidência do IR sobre a transmissão causa mortis de cotas de FI Renda Fixa, sem, no entanto, distinguir o tratamento tributário aplicável aos FIs Renda Fixa Fechados e os FI Renda Fixa constituídos sob a forma de condomínio aberto (“FIs Renda Fixa Abertos”).

A SC COSIT nº 383/2014 havia anteriormente entendido que a transferência de cotas de FIs Renda Fixa (sem fazer distinção entre Fis Renda Fixa Abertos ou Fechados), ocorrida em razão da abertura do formal de partilha, implicaria efetivo evento de resgate ou liquidação desta aplicação financeira (i.e., do FI Renda Fixa), o qual deveria ser tributado conforme à sistemática de retenção na fonte, em linha com o estabelecido pelo artigo 46 da IN RFB nº 1.585/2015 (ou seja, às alíquotas de 15% a 22,5%, a depender do prazo da aplicação). Com relação ao método de apuração dos rendimentos, a SC COSIT nº 383/2014 havia rejeitado a possibilidade de se adotar como valor de resgate/liquidação das cotas o seu valor de mercado[²], entendendo que deveria ser utilizado, para este fim, seu valor escritural, acrescido dos correspondentes ganhos auferidos. Por fim, no que tange à responsabilidade pela retenção e recolhimento do imposto, quando devido, o consulente não havia questionado este ponto à ocasião, de modo que ele não foi abordado de forma expressa na SC COSIT nº 383/2014.

Agora, com a reforma parcial promovida pela SC COSIT nº 21/2024, a COSIT passou a adotar o entendimento de que o racional acima não se aplica aos FI Renda Fixa Fechados e tampouco aos FIA Fechados, de modo que a incidência do IR sobre a transmissão causa mortis de cotas desses fundos deve se dar com base na sistemática de apuração de ganho de capital, às Alíquotas Progressivas, devendo o valor de alienação/transferência das cotas ser determinado com base no seu valor de mercado, e recaindo a responsabilidade pelo recolhimento do imposto, quando devido, sobre o administrador do fundo, ou a instituição que intermediar recursos por conta e ordem (no caso de aplicações em fundos de investimento administrados por outra instituição), conforme racional mencionado acima.

Neste contexto, destaca-se que posicionamento similar já havia sido adotado no âmbito da Solução de Consulta COSIT nº 245, de 23.10.2023 (“SC COSIT nº 245/2023”), que manifestou o entendimento de que, na transferência de cotas de FIs Fechados Renda Fixa em decorrência de evento sucessão causa mortis, o artigo 23 da Lei nº 9.532/1997 seria inaplicável, e a responsabilidade pelo recolhimento do IR seria do administrador do FI Fechado Multimercado, ou da instituição que intermediasse recursos por conta e ordem dos respectivos cotistas. Contudo, a recém-publicada SC COSIT nº 21/2024 é mais abrangente, pois alcança não apenas as transferências de cotas de FIs Renda Fixa Fechados ocorridas em razão de sucessão causa mortis, mas também as transferências de cotas de FIAs Fechados ocorridas em razão de sucessão causa mortis, bem como as doações em adiantamento de legítima de cotas de FIs Renda Fixa Fechados e FIAs Fechados.

A equipe da Consultoria Tributária está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos acerca deste tema.


[¹] O qual, para os casos de transferência de direito de propriedade por sucessão, nos casos de herança, legado ou por doação em adiantamento da legítima, prevê a tributação do IR sob a sistemática de ganho de capital, via auto recolhimento, mediante aplicação de alíquota fixa de 15%, com possibilidade de avaliação do bem pelo valor de mercado ou pelo valor constante da declaração de bens do de cujus ou doador.
[²] Verbis:
“Não se pode, no entanto, falar em apuração a valor de mercado de uma aplicação financeira de renda fixa que passa a pertencer a determinada pessoa em razão do falecimento do titular, e consequente incidência de norma oriunda do direito das sucessões, uma vez que a aplicação financeira terá necessariamente de ter transferida a sua titularidade para aquele a quem a norma civil legitima como novo titular da aplicação, por herança ou legado, pelo valor escritural do título acrescido dos correspondentes ganhos auferidos. O valor da aplicação financeira é, portanto, líquido e certo, não carecendo de avaliação sob qualquer outro método, uma vez que é aquele constante dos registros da respectiva instituição financeira, restando apenas o esclarecimento sobre a incidência ou não de Imposto de Renda na Fonte por ocasião da transmissão de titularidade, que se dá por força da incidência das normas de direito civil por força da sucessão havida” (grifamos).
ESTE BOLETIM É MERAMENTE INFORMATIVO AOS NOSSOS CLIENTES E COLABORADORES. FICAMOS À DISPOSIÇÃO PARA EVENTUAIS ESCLARECIMENTOS SOBRE A(S) MATÉRIA(S) AQUI VEICULADA(S).
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