Solução de Consulta COSIT nº 138/2021 – Remessa de Prêmio de Seguro – Aplicação Artigo Lucro das Empresas – TDT Brasil/Noruega
Foi publicada, em 24.09.2021, a Solução de Consulta emitida pela Coordenação-Geral de Tributação (“COSIT”) da Receita Federal do Brasil (“RFB”) nº 138, de 20.09.2021 (“Solução de Consulta COSIT nº 138/2021” ou apenas “SC COSIT 138/2021”), que analisou a tributação pelo Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (“IRRF”) nas remessas efetuadas por fonte brasileira a título de prêmios de seguros para beneficiário pessoa jurídica seguradora (devidamente assim regulamentada) residente na Noruega, sem estabelecimento permanente no Brasil, tendo em vista a existência de Tratado destinado a evitar a dupla tributação da renda (“TDT” ou o “TDT Brasil/Noruega”)[¹].
De acordo com referida SC COSIT 138/2021, regra geral (i.e. caso a entidade seguradora beneficiária de prêmio de seguro remetido ao exterior seja residente em país com o qual o Brasil não tenha pactuado TDT), há incidência do IRRF, conforme artigo 741 do Regulamento do Imposto sobre a Renda (“RIR/2018”)[²], à alíquota de 25% (vinte e cinco por cento), tendo em vista ser considerado “serviço em geral” (i.e. não sendo considerado serviço técnico ou assistência técnica).
Contudo, no caso analisado pela referida Solução de Consulta COSIT, a relação entre a consulente, empresa estabelecida no Brasil, contratante do seguro e fonte de pagamento do prêmio de seguro, e a empresa seguradora residente na Noruega e beneficiária dos valores objeto da remessa, é regida por TDT Brasil/Noruega. Deste modo, conclui a COSIT que:
(i) Sob uma perspectiva de incidência tributária, diante da prevalência dos TDTs frente à legislação doméstica[³], a legislação que governa as transações internacionais envolvendo residentes nos países contratantes (Brasil e Noruega) deverá levar em consideração os dispositivos do TDT Brasil/Noruega;
(ii) Neste contexto, para fins de incidência de IRRF nas remessas de prêmio de seguros efetuadas do Brasil para a Noruega, deve-se verificar a natureza jurídica destes valores e o respectivo enquadramento perante o TDT Brasil/Noruega;
(iii) quanto à natureza das operações de seguro, a COSIT concluiu que:
a. Como já concluído na Solução de Consulta COSIT 47/2019, estes consistem em “serviços”;
b. Entretanto, não são do subtipo “serviços técnicos” (conforme definição contida na Instrução Normativa RFB no. 1.455, de 06.03.2014), pois ausente elemento caracterizador que ensejaria tal classificação, qual seja, o conhecimento técnico ou científico, conforme já tinha sido reconhecido pela COSIT (acerca das operações de resseguro) na Solução de Consulta COSIT nº 62/2017, reformada pela Solução de Consulta COSIT nº 91/2018;
c. Assim, diante do Ato Declaratório Interpretativo (ADI) RFB nº 5, de 16.06.2014, tendo em vista que não consistem em serviços técnicos, os valores em questão (i.e. prêmios de seguros) não têm natureza de royalties, razão pela qual o artigo 12 (Royalties) do TDT Brasil/Noruega não é aplicável ao caso;
(iv) Deste modo, não sendo os prêmios de seguro enquadrados como royalties e tampouco nos demais artigos do TDT Brasil/Noruega que dispõem sobre “rendimentos específicos” (i.e. juros, dividendos, ganho de capital, profissões independentes), o enquadramento da remessa de prêmio de seguro gira em torno do artigo 7º do TDT (Lucro das Empresas), que tem caráter subsidiário, sendo que:
a. O caráter subsidiário do artigo 7º (Lucro das Empresas) e sua aplicação na hipótese de o rendimento não ter enquadramento mais específico, já foi confirmado na Solução de Consulta COSIT nº 589/2017, tratando do TDT Brasil/México;
b. Pela aplicação do artigo 7º (Lucro das Empresas), os rendimentos que compõem o lucro de uma empresa serão apenas tributáveis (i.e. tributação exclusiva) no Estado de Residência do beneficiário da renda/rendimento, a não ser que a empresa exerça sua atividade no outro Estado (i.e. no Estado de Fonte) por meio de um estabelecimento permanente (“PE”);
(v) Assim, tendo em vista que a seguradora residente na Noruega não possui PE no Brasil (assim definido pelo artigo 5º do TDT Brasil/Noruega), a remessa de prêmio de seguro recebido por seguradora residente na Noruega por fonte brasileira, enquadra-se na hipótese do artigo 7º (Lucro das Empresas), não havendo incidência de IRRF no Brasil (Estado de Fonte), uma vez que, pela aplicação do TDT Brasil/Noruega, tais rendimentos seriam tributados exclusivamente na Noruega (Estado de Residência), conforme conclusão alcançada na referida SC COSIT 138/2021, abaixo transcrita:
“Conclusão
26. Diante do que foi exposto, soluciona-se a presente consulta respondendo ao consulente que:
a) para efeitos de aplicação da Convenção Brasil-Noruega, o pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa de prêmios de seguro por fonte brasileira para empresa residente na Noruega sem estabelecimento permanente no Brasil consiste em lucro da empresa beneficiária, que se enquadra no Artigo 7 da referida Convenção; e
b) nessa hipótese, mencionados prêmios de seguro são tributados apenas na Noruega em razão do disposto no Artigo 7 (1) da Convenção Brasil-Noruega e, portanto, não estão sujeitos ao IRRF.” (destacamos)
A nosso ver, esta Solução de Consulta COSIT 138/2021 constitui importante marco na interpretação da RFB/COSIT relativamente à aplicação do artigo “Lucro das Empresas” dos TDTs assinados pelo Brasil, ampliando esta interpretação para a atividade empresarial de seguros, e reconhecendo a possibilidade de inclusão de rendimentos que sejam parte do lucro das empresas como passíveis de enquadramento neste artigo Lucro das Empresas (desde que não haja um enquadramento em artigo do TDT mais específico ao referido rendimento; e que não haja um PE no Estado de Fonte relacionado ao referido rendimento), implicando, neste caso, não incidência de IRRF no Estado de Fonte (Brasil) nas remessas desses rendimentos (e.g. prêmios de seguros) efetuadas a entidades beneficiárias (seguradoras) residentes no outro Estado contratante de Residência (Noruega).
Vale recordar que já tivemos êxito na esfera judicial acerca da aplicação do artigo Lucro das Empresas aos rendimentos obtidos em operações de derivativo (especificamente operação de swap) realizadas no mercado financeiro brasileiro por instituição financeira residente na Espanha, sem PE no Brasil, conforme já noticiamos no Velloza News Tributário no. 476 (no link https://velloza.com.br/news-tributario-no-476).
Não obstante, destacamos que outros casos envolvendo remessas de rendimentos para outros países demandam análise da existência ou não de convenção internacional para evitar a dupla tributação da renda (i.e. TDT) entre os países envolvidos, das particularidades da operação e, caso haja TDT, o estudo específico deste para fins do devido enquadramento deste rendimento no respectivo TDT.
A equipe da Consultoria Tributária está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos acerca deste tema.
[¹] A Convenção foi aprovada pelo Decreto Legislativo nº 50, de 05.12.1981 (“Decreto Legislativo nº 50/81”), promulgada pelo Decreto nº 86.710, de 09.12.1981 (“Decreto nº 86.710/81”); e alterada pelo Decreto nº 9.996, de 08 de agosto de 2019 (“Decreto nº 9.996/19”).
[²] Aprovado pelo Decreto nº 9.580, de 22 de novembro de 2018 (“Decreto nº 9.580/2018”) “Art. 741. Ficam sujeitos à incidência do imposto sobre a renda na fonte, observado o disposto neste Capítulo, a renda e os proventos de qualquer natureza provenientes de fontes situadas no País, quando percebidos:
I – pelas pessoas físicas ou jurídicas residentes ou domiciliadas no exterior (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 97, caput, alínea “a”);
II – pelos residentes no País que estiverem ausentes no exterior por período superior a doze meses, exceto aqueles mencionados no art. 15 (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 97, caput, alínea “b”);
III – pela pessoa física proveniente do exterior, com visto temporário, nos termos do parágrafo único do art. 17 (Decreto-Lei nº 5.844, de 1943, art. 97, caput, alínea “c”; e Lei nº 9.718, de 1998, art. 12, caput, inciso I); e
IV – pela pessoa física residente no País que passar à condição de não residente, a partir da data de caracterização da nova condição (Lei nº 3.470, de 1958, art. 17, § 3º).”
[³] O artigo 98 da Lei nº 5.172, de 25.10.1966 (Código Tributário Nacional – “CTN”) determina expressamente que os tratados e convenções internacionais, em matéria tributária, devem prevalecer sobre a legislação doméstica.