Fonte: Gazeta Mercantil
Artigo de autoria do Dr. Cesar Amendolara, Sócio V&G, e Dr. Leandro Vilarinho Advogado Associado V&G.
São Paulo, 14 de abril de 2009 – Desde a entrada em vigor da Lei 11.638/07, as sociedades de grande porte do tipo limitada têm discutido a obrigatoriedade da publicação das demonstrações financeiras. Em que pese o debate sobre a necessidade de transparência das informações, é oportuno afirmar que, tendo em vista o princípio da legalidade, elas não estão legalmente obrigadas a publicar seus balanços.
A legislação previu que, independentemente da forma em que estejam constituídas, devem ser aplicadas às sociedades de grande porte as disposições da Lei das S.As., estritamente em relação à escrituração e à elaboração das demonstrações financeiras, bem como à obrigatoriedade do parecer do auditor independente registrado na Comissão de Valores Mobiliários (CVM). Essas obrigações demonstram uma evolução legislativa na direção da necessária transparência.
A discussão, que já atingiu os tribunais, decorre do fato de o projeto de lei que deu origem à Lei 11.638/07 ter previsto em seu texto original que se aplicaria a qualquer tipo de sociedade de grande porte as regras da Lei das S.As. referentes à publicação das demonstrações financeiras. Ocorre que a parte referente à publicação foi propositalmente suprimida do texto da lei que entrou em vigor, ficando clara e inequívoca a intenção do legislador na redação definitiva do mencionado dispositivo legal.
O debate maior, que transcende a legislação mencionada, é o grau de transparência que deve ser dado às informações das sociedades limitadas de grande porte. Não é o caso de defender o total sigilo das demonstrações, mas não há como interpretar que a legislação tornou a publicação em jornais e diários oficiais obrigatória para tais sociedades.
A escolha do tipo limitada ocorre, muitas vezes, justamente pela sistemática mais simplificada. Fosse a intenção do legislador brasileiro que as limitadas de grande porte seguissem as disposições da Lei das S.As., poderia simplesmente ter limitado o tamanho das empresas aptas a assumir esse tipo societário. De outro modo, também não teria estabelecido para as limitadas, no Código Civil Brasileiro, um regime próprio de publicações (redução de capital, liquidação, incorporação, etc.) que não determina a das demonstrações financeiras.
As sociedades limitadas de grande porte, ainda que não obrigadas por lei, podem perfeitamente divulgar suas demonstrações financeiras aos terceiros interessados que com ela mantenham relações negociais, como, por exemplo, para obtenção de financiamentos bancários, captação de recursos para projetos, etc..
Há um exemplo que serve bem de analogia: a despeito de a Lei das S.As. não prever as regras que constam do regulamento do Novo Mercado, regulamentado pela BOVESPA, muitas das sociedades optam por aderir a esse segmento em busca de um intangível que é muito valorizado no mercado — a governança corporativa. Não é só por meio de uma regra obrigatória, portanto, que se obterá o efeito por muitos almejado de tornar as limitadas mais transparentes. Para essa finalidade, outros caminhos podem ser adotados, dentre eles a divulgação das demonstrações na rede mundial de computadores.
Na prática, o que se tem verificado são manifestações dos órgãos reguladores e registrários — Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e Departamento Nacional de Registro do Comércio (DNRC) — no sentido de facultar a publicação das demonstrações financeiras das sociedades limitadas de grande porte. E se tais entendimentos vêm sendo contestados judicialmente, talvez o sejam mais por interesses econômicos na comercialização de referidas publicações do que no interesse de tornar as sociedades limitadas brasileiras mais transparentes.
Assim, deve restar claro que a atual legislação brasileira não obriga as sociedades limitadas de grande porte a publicar suas demonstrações financeiras conforme determina a Lei das S/As. e, se outro entendimento for estabelecido, em especial, como condição para o arquivamento dos atos societários de tais sociedades, restará com toda legitimidade o remédio judicial para a garantida de direitos. A alteração dessa realidade só dará por meio do devido processo legislativo conforme constitucionalmente previsto.
(Cesar Amendolara (cesar.amendolara@vgladv.com.br) é advogado especializado em direito societário e sócio do escritório Velloza, Girotto e Lindenbojm Associados.
Colaborador: Leandro Vilarinho Borges é advogado especializado em direito societário e associado ao escritório Velloza, Girotto e Lindenbojm Associados.)