SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Tema: Limites da multa fiscal qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio, tendo em vista a vedação constitucional ao efeito confiscatório – Tema 863 da repercussão geral.
RE 736090 – POSTO TROPIFERCO LTDA E OUTRO(A/S) x UNIÃO – Relator: Ministro Dias Toffoli.
Apreciando o Tema 863 da repercussão geral, o Supremo Tribunal Federal, por unanimidade, fixou a seguinte tese: “Até que seja editada lei complementar federal sobre a matéria, a multa tributária qualificada em razão de sonegação, fraude ou conluio limita-se a 100% (cem por cento) do débito tributário, podendo ser de até 150% (cento e cinquenta por cento) do débito tributário caso se verifique a reincidência definida no art. 44, § 1º-A, da Lei nº 9.430/96, incluído pela Lei nº 14.689/23, observando-se, ainda, o disposto no § 1º-C do citado artigo”.
Estabeleceu-se que a decisão produza efeitos a partir da edição da Lei nº 14.689/23, mantendo-se os patamares atualmente fixados pelos entes da federação até os limites da tese. Ficam ressalvados desses efeitos: (i) as ações judiciais e os processos administrativos pendentes de conclusão até a referida data; e (ii) os fatos geradores ocorridos até a referida data em relação aos quais não tenha havido o pagamento de multa abrangida pelo presente tema de repercussão geral.
Segundo o voto do relator, as limitações qualitativas e quantitativas às sanções tributárias devem ser estabelecidas pelo legislador complementar, observando-se a razoabilidade e a proporcionalidade, conforme o art. 146, inciso III, da Constituição. O objetivo é não apenas conferir efetividade às normas constitucionais protetivas do sujeito passivo, mas também uniformizar o tratamento da matéria nas legislações dos diversos entes da federação.
Notou-se que o legislador complementar não editou normas gerais sobre os limites qualitativos e quantitativos das sanções tributárias impostas por infração à legislação tributária, objeto do tema em discussão. Entendeu-se que, na ausência dessas normas e estando em jogo norma constitucional protetiva de direitos fundamentais do contribuinte, como a vedação do confisco, cabe ao Poder Judiciário atuar quando provocado.
Os ministros concluíram que um patamar baixo de multas as torna ineficazes, sem força para reprimir ou inibir comportamentos dos agentes que, no caso da multa qualificada, atuam para infringir a lei. Por outro lado, um patamar muito alto poderia estimular uma arrecadação desmedida, permitindo a edição de novas leis que majoram valores de multas anteriormente estabelecidos em patamar mais baixo, desviando-se das funções que as sanções devem desempenhar na ordem jurídica.
Foi mencionado o Projeto de Lei Complementar nº 124/22, em tramitação no Senado Federal, que sugere acrescentar diversos parágrafos ao art. 142 do CTN, preconizando que as multas tributárias sejam graduadas motivadamente, considerando-se determinadas circunstâncias atenuantes.
Assegurou-se que esse PLP serviu de base para a fixação da tese de repercussão geral, inclusive o mesmo teto de 150% é utilizado na última versão do PLP 144/22. Além disso, constatou-se que a solução proposta também está, em sua maior parte, acolhida nos arts. 58 e seguintes do PLP 68/2024 — que trata, entre outros assuntos, das infrações, penalidades e encargos moratórios relativos ao novo imposto: IBS.
Tema: Possibilidade de o Poder Executivo reduzir o percentual do REINTEGRA.
ADI 6040 – INSTITUTO AÇO BRASIL
ADI 6055 – CONFEDERAÇÃO NACIONAL DA INDÚSTRIA
Relator: Ministro Gilmar Mendes.
Por maioria, os ministros do Supremo Tribunal Federal declararam a constitucionalidade do disposto no art. 22 da Lei 13.043/14. Esta lei autoriza o poder executivo federal a estabelecer o percentual para apuração de crédito pelos exportadores sobre a receita auferida com a exportação de bens para o exterior no âmbito do Regime Especial de Reintegração de Valores Tributários (“Reintegra”) para as Empresas Exportadoras. Entendeu-se que se trata de uma medida de subvenção governamental, não se confundindo com as normas que outorgam imunidades às exportações.
Prevaleceu o entendimento de que o Reintegra atua como benefício fiscal, ajuda financeira e subvenção econômica, conforme a Lei 4.320/1964. Assim classificado, não haveria ilegalidade ou inconstitucionalidade na redução do percentual de creditamento. Argumentou-se que o constituinte buscou alcançar a neutralidade fiscal em relação às exportações, estimular o desenvolvimento da indústria nacional e garantir o superávit da balança comercial. Em resumo, a Constituição Federal imunizou as seguintes operações e rendimentos relacionados à exportação: 1) as receitas decorrentes de exportação da incidência de contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico; 2) os produtos industrializados do IPI; e 3) as operações relativas à circulação de mercadorias e prestação de serviços do ICMS e, em relação ao último, também do ISS.
Diferentemente das imunidades, que incentivam qualquer tipo de produto ou serviço destinado à exportação, o Reintegra incentiva especificamente a indústria nacional. Isso ocorre porque o creditamento só se aplica a bens objeto de industrialização, atendidas as condições estabelecidas em lei.
Ficaram vencidos os ministros Edson Fachin e Luiz Fux, que compreendem o Reintegra como instrumento e garantia do princípio do país do destino, abrigado no princípio da isonomia (art.150, II) e positivado na Constituição Federal mediante as regras de imunidade tributária. Estas, por sua vez, contemplam não apenas o método da exoneração, mas também o método do crédito/reembolso, em consonância com as regras do Sistema Multilateral do Comércio, destacando-se o previsto no GATT (General Agreement on Tariffs and Trade) e ASMC (Acordo sobre Subsídios e Medidas Compensatórias). Nesse sentido, defendiam que a atuação do Poder Executivo não pode ocorrer de forma completamente discricionária, pois o Reintegra não seria mero benefício fiscal, mas um mecanismo de desoneração do exportador dos resíduos tributários, cujos instrumentos de compensação não foram suficientes para neutralizá-los.
Tema: Incidência de IRPJ e CSLL sobre os resultados positivos de equivalência patrimonial apurados por controladas no Exterior.
RE 870214 – VALE S/A x UNIÃO – Relator: Ministro André Mendonça.
Um novo pedido de vista suspendeu a análise do agravo interno interposto pela União contra decisão que negou seguimento ao seu recurso extraordinário. A decisão original entendeu que: i) Quanto à incidência de IRPJ e CSLL sobre os lucros auferidos pela empresa contribuinte por meio de empresa controlada no exterior, o debate seria infraconstitucional. Isso porque o acórdão recorrido concluiu pela prevalência dos tratados e convenções internacionais sobre a legislação tributária nacional, afastando a tributação; e ii) Sobre o afastamento da aplicação do Método da Equivalência Patrimonial (MEP) para definir a base de cálculo da tributação do lucro das controladoras, o acórdão do Superior Tribunal de Justiça baseou-se na interpretação de normas reguladoras, conferindo natureza legal à discussão.
Em 04/10/2024, o ministro Gilmar Mendes apresentou voto-vista divergente do relator. Ele deu provimento ao agravo e, consequentemente, ao recurso extraordinário, reconhecendo a possibilidade de computar como acréscimo patrimonial positivo da contribuinte os lucros de suas empresas controladas na Bélgica, Dinamarca e Luxemburgo.
O ministro entendeu que o cerne do recurso não trata da interpretação de tratados internacionais, considerando-os inaplicáveis ao caso. A discussão, na verdade, seria sobre a compatibilidade do art. 74 da MP 2.158-35 com o conceito de renda — dispositivo já declarado constitucional pelo plenário do Supremo na situação em questão (controle de empresa estrangeira por empresa brasileira), mas afastado pelo STJ.
Assim, aplicou o entendimento do RE 541090, reconhecendo a possibilidade de incidência do IRPJ e da CSLL sobre o lucro da controladora obtido por meio de empresas controladas no exterior.
Por outro lado, o ministro André Mendonça votou negando provimento ao agravo, concluindo que a análise do caso depende da aplicação de normas infraconstitucionais. Ele argumentou que o Método de Equivalência Patrimonial, como instrumento de avaliação contábil de empresas estrangeiras em relação ao patrimônio da matriz nacional, não refletiria base de cálculo diferente do próprio lucro ou renda das empresas. Isso porque sua aplicação é neutra em relação ao lucro real tributável pelo IRPJ e pela CSLL, excluindo, por exemplo, variações cambiais no exterior e mutações patrimoniais das controladas.
Agora, o ministro Alexandre de Moraes pediu vista dos autos, suspendendo o julgamento.
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Tema: Definir se a impenhorabilidade de quantia inferior a 40 salários-mínimos é matéria de ordem pública, podendo ser reconhecida de ofício pelo juiz – Tema 1235 dos recursos repetitivos.
REsp 2061973 – AGÊNCIA NACIONAL DE TRANSPORTES TERRESTRES x SOBRATOL-TRANSPORTES RODOVIARIOS LTDA e OUTROS – Relatora: Ministra Nancy Andrighi.
Julgamento conjunto: REsp 2066882.
A Corte Especial, por unanimidade, entendeu que a impenhorabilidade de quantia inferior a 40 salários-mínimos não é matéria de ordem pública e não pode ser reconhecida de ofício.
Os ministros afirmaram que o CPC/2015, ao suprimir a palavra “absolutamente” no caput do art. 833 (correspondente ao art. 649 do CPC/73), tratou a impenhorabilidade como relativa. Além disso, regulamentou a penhora de dinheiro em depósito ou em aplicação financeira, prevendo que, após a determinação de indisponibilidade, cabe ao executado, no prazo de 5 dias, comprovar que as quantias tornadas indisponíveis são impenhoráveis. A consequência para a ausência de manifestação é a conversão da indisponibilidade em penhora (art. 854, §3º, I, e §5º), restando ao executado apenas o manejo de impugnação ao cumprimento de sentença ou embargos à execução (arts. 525, IV, e 917, II).
Atestaram ainda que o legislador não autorizou o juízo a reconhecer a impenhorabilidade de ofício. Se assim quisesse, teria feito de forma expressa, como no caso do §1º do art. 854, hipótese em que se admitiu que o juiz determine de ofício o cancelamento de indisponibilidade que ultrapasse o valor executado.
Assim, concluíram que o Código de Processo Civil não autoriza o juiz a reconhecer a impenhorabilidade prevista no art. 833, X, de ofício. Pelo contrário, atribui expressamente ao executado o ônus de alegar tempestivamente a impenhorabilidade do bem constrito, regra que não tem natureza de ordem pública.
Foi fixada a seguinte tese para o repetitivo: “A impenhorabilidade de quantia inferior a 40 salários-mínimos (art. 833, X, do CPC) não é matéria de ordem pública e não pode ser reconhecida de ofício pelo juiz, devendo ser arguida pelo executado no primeiro momento em que lhe couber falar nos autos ou em sede de embargos à execução ou impugnação ao cumprimento de sentença, sob pena de preclusão”.
Tema: Saber se é cabível a concomitância entre multa isolada e multa de ofício por falta de pagamento de IRPJ/CSLL apurados no ajuste anual.
REsp 2150276 – FAZENDA NACIONAL x TIISA – INFRAESTRUTURA E INVESTIMENTOS S.A – Relator: Ministro Francisco Falcão.
A 2ª Turma do STJ, por unanimidade, negou provimento à parte conhecida do recurso especial da Fazenda Nacional e atestou ser pacífica a jurisprudência da Corte no sentido de ser ilegal a aplicação concomitante das multas isolada e de ofício previstas nos incisos I e II do art. 44 da Lei 9.430/96, mesmo após a vigência da Lei 11.488/2007.
Dessa forma, foi mantido o acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região, cuja conclusão foi pela impossibilidade de cobrança simultânea da multa isolada e da multa de ofício. Entendeu-se que a infração menos grave (multa isolada) é absorvida pela infração mais grave (multa de ofício).