SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
Tema: Relativização da coisa julgada material no âmbito do direito tributário, por decorrência de posterior manifestação jurisdicional da Suprema Corte em sentido oposto ao alcançado pela sentença que declarou a (in)constitucionalidade de lei instituidora de tributo – Tema 881
RE 949297 – UNIÃO x TBM TEXTIL BEZERRA DE MENEZES S/A – Relator: Min. Edson Fachin
Tema: Saber se as decisões do Supremo Tribunal Federal em controle difuso fazem cessar os efeitos futuros da coisa julgada em matéria tributária – Tema 885
RE 955227 – UNIÃO X BRASKEM S.A – Relator: Min. Roberto Barroso
A Suprema Corte, analisando conjuntamente os Temas 881 e 885 da repercussão geral, definiu, de forma unânime, que a declaração de (in)constitucionalidade, em sede de recurso extraordinário com repercussão geral, possui os mesmos efeitos vinculantes e eficácia para todos, assim como ocorre nas ações de controle abstrato. Por essa razão, é necessária a interrupção dos efeitos da coisa julgada nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo, independentemente do tributo que se esteja discutindo, quando o STF se manifestar em sentido oposto, em controle concentrado ou em controle difuso, desde que de acordo com a sistemática da repercussão geral.
Para os ministros, a publicação da ata de julgamento em controle concentrado ou controle difuso em repercussão geral equivale ao primeiro dia de vigência da nova norma que somente produzirá efeitos após os referidos períodos de vacância da lei. Após a efetiva vigência, as hipóteses de incidência descritas na lei automaticamente voltarão a produzir efeitos para aqueles contribuintes, que, consequentemente, voltarão a praticar os fatos geradores da obrigação tributária, sendo desnecessário o ajuizamento de qualquer ação por parte da Fazenda Pública.
Também foi definido que quando houver decisão do STF, em controle concentrado ou em repercussão geral, que seja contrária à coisa julgada favorável ao contribuinte, em relações jurídicas tributárias de trato sucessivo, existirá produção de norma jurídica nova. Neste sentido, por maioria, a Corte compreendeu que, ocorrendo tal situação, que assemelhe-se a criação de novo tributo, a depender do tributo discutido, deve-se observar a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena, e, no caso das contribuições para a seguridade social, a anterioridade nonagesimal. Restaram vencidos neste ponto os ministros Gilmar Mendes, André Mendonça, Alexandre de Moraes e Dias Toffoli.
Nos recursos analisados a discussão girava em torno dos efeitos da coisa julgada que declarou a inconstitucionalidade da Lei 7.689/88, instituidora da CSL, em ações individuais de contribuintes. Na hipótese, restou pacificado que acórdão proferido pelo STF, em 2007, que declarou a constitucionalidade do tributo na ADI 15, não pode ser invocado para a desconstituição de créditos anteriores ao referido julgamento em controle concentrado, uma vez que não pode retroagir para justificar a lavratura de autos de infração posteriores. Entretanto, a partir de 2007, com o julgamento da ADI 15, passou a ser exigível a CSL.
A Suprema Corte, todavia, deixou de modular os efeitos da decisão, entendendo pela sua desnecessidade. Restaram vencidos neste aspecto os ministros Edson Fachin, Nunes Marques, Luiz Lux, Ricardo Lewandowski e Dias Toffoli, que compreendiam que, por razões de segurança jurídica e da proteção da confiança dos contribuintes acobertados pela coisa julgada, a decisão somente produziria efeitos a partir da publicação da ata do julgamento dos Temas 881 e 885.
Por fim, a Suprema Corte fixou a seguinte tese de repercussão geral: “1. As decisões do STF em controle incidental de constitucionalidade, anteriores à instituição do regime de repercussão geral, não impactam automaticamente a coisa julgada que se tenha formado, mesmo nas relações jurídicas tributárias de trato sucessivo. 2. Já as decisões proferidas em ação direta ou em sede de repercussão geral interrompem automaticamente os efeitos temporais das decisões transitadas em julgado nas referidas relações, respeitadas a irretroatividade, a anterioridade anual e a noventena ou a anterioridade nonagesimal, conforme a natureza do tributo.”
SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA
Tema: Cabimento de ação rescisória visando desconstituir ação coletiva quando houver mudança de jurisprudência
AR 6015 – FAZENDA NACIONAL x SINDICATO DAS EMPRESAS DE COMÉRCIO EXTERIOR DO ESTADO DE SANTA CATARINA – Relator: Min. Gurgel de Faria
Com base no entendimento do STF no Tema 885 da repercussão geral, a 1ª Seção definiu que é possível, por meio de ação rescisória, reverter o resultado de processos já transitados em julgado, quando houver alteração superveniente da jurisprudência. No caso concreto, fixou-se que a interrupção desses efeitos deve ocorrer com a publicação da ata de julgamento do Tema 906/STF, momento em que a tese jurídica fixada passou a ter força normativa, porque proferida em sede de repercussão geral.
Foi objeto de análise a ação rescisória ajuizada pela Fazenda Nacional contra decisão do STJ que, com base em jurisprudência então vigente (EREsp 1.411.749, 28/05/2014), dispensou contribuintes do recolhimento de IPI na revenda de importados. O tema está atualmente pacificado de forma desfavorável aos contribuintes, tendo o STJ decidido pela tributação por meio de recurso repetitivo (Tema 912/STJ) e chancelado pelo STF em repercussão geral. (Tema 906/STF).
Na ação em análise, o relator, Min. Gurgel de Faria, em voto vencedor, afastou o óbice da Súmula 343/STF, segundo a qual “não cabe ação rescisória por ofensa a literal disposição de lei, quando a decisão rescindenda se tiver baseado em texto legal de interpretação controvertida nos tribunais”, ante a alteração superveniente da jurisprudência e “o fato de a ação ordinária ser coletiva”, o que poderia gerar efeitos deletérios sobre a isonomia e livre concorrência. Fundamentou que a particularidade dos presentes autos, relacionada ao caráter normativo da decisão transitada em julgado que se pretende rescindir, tem o condão de afastar a Súmula 343/STF. Ademais, relembrou que no voto proferido na AR 4443, julgado em 2019, havia ressaltado que o STF pacificou o entendimento de que a Súmula 343, no âmbito constitucional, mostrava-se adequada as situações de mutação jurisprudencial, porém, naquela época, ainda havia discussão quanto ao seu alcance nos casos de repercussão geral. Entretanto, considerou que a aplicação da referida súmula ganhou novos contornos com o avanço do julgamento dos Temas 881 e 885 no STF, já que esses temas cuidam dos limites da coisa julgada em matéria tributária, sobretudo nas relações de trato sucessivo, diante do julgamento em controle concentrado e difuso de constitucionalidade, respectivamente.
O ministro pontuou que a maioria de votos formada na Suprema Corte permite que se revisite a questão do conhecimento das ações rescisórias ajuizadas no STJ nos casos em que a decisão transitada em julgado, envolvendo relação jurídico tributário de trato sucessivo, que esteja em desconformidade com precedente obrigatório firmado em momento posterior a coisa julgada. Assim, como a tese jurídica prevalescente no STF é de que a natureza vinculante reconhecida aos julgados proferidos sob o rito da repercussão geral possibilita a alteração do estado de direito, situação que autoriza a flexibilização da coisa julgada, de acordo com cláusula rebus sic stantibus, aplicável as relações de trato sucessivo, sendo que nesse contexto, a modificação do status quo tem efeitos imediatos automáticos, tornando-se despicienda até a propositura de ação rescisória ou de ação revisional. Isso porque, na linha do voto do Ministro Roberto Barroso, relator do Tema 885/STF, os precedentes qualificados, produzem norma jurídica nova, com efeitos a partir da publicação da ata de julgamento.
Nessa perspectiva, compreendeu que não se mostra possível equiparar a mutação jurisprudencial, que atrai a aplicação da Súmula 343/STF, com o surgimento de norma jurídica decorrente da formação do precedente obrigatório, motivo pelo qual esse verbete sumular revela-se inaplicável nos casos em que a ação rescisória está fundamentada no inciso V do artigo 966/CPC e na desconformidade entre a conclusão alcançada na decisão rescindenda e a tese jurídica fixada nos julgados com força vinculante e, portanto, tendo eficácia normativa.
Ainda nesse sentido, o Min. Gurgel destacou que a legitimidade da relativização da coisa julgada nas decisões referentes as relações jurídicas tributária de trato sucessivo, contrárias a precedente obrigatório, também se apoia na necessidade de se evitar a geração de situações anti-isonômicas, com impacto na livre concorrência, como se constata no recurso extraordinário representativo da controvérsia relativo ao Tema 885/STF e também no caso da rescisória em tela. Assim, posicionou-se favoravelmente ao conhecimento da ação rescisória.
No tocante a eficácia temporal da decisão rescindenda, ressaltou que, partindo da premissa que as decisões judiciais de caráter vinculante têm o condão de modificar a situação de direito, nas relações tributárias de trato sucessivo, a pretensão veiculada na ação rescisória que busca a aplicação da tese repetitiva de observância obrigatória, fixada no julgamento do Tema 912/STJ, já seria suficiente para interromper os efeitos da coisa julgada, entretanto, compreendeu que não se pode deixar de considerar que o Supremo, entendendo que a questão de fundo tem contornos constitucionais, afetou a mesma temática, ao rito da repercussão geral, firmando o entendimento de que é constitucional a incidência. Por essa razão, concluiu que a interrupção desses efeitos deve ocorrer com a publicação da ata de julgamento do Tema 906/STF, momento em que a tese jurídica fixada passou a ter força normativa, porque proferida em sede de repercussão geral.
Divergiram em relação ao conhecimento da ação rescisória os ministros Mauro Campbell, Assusete Magalhães e Regina Helena, que entendem não ser possível afastar a Súmula 343/STF.
Quanto ao mérito, a 1ª Seção, por unanimidade, julgou parcialmente procedente os pedidos para rescindir o acórdão objeto da presente ação e, em novo julgamento, negar provimento ao Recurso Especial n. 1.427.246/SC.