Fonte: Valor Econômico
Por Luciana Seabra | De São Paulo
Desde os 30 anos, Philip Chaves, funcionário do Google no Brasil, recebe ações da empresa como bônus. Os papéis, negociados na bolsa americana Nasdaq, são oferecidos na forma de opções de compra de ações, as chamadas “stock options”. Chaves, hoje com 36 anos, já chegou a vender parte das ações e trazer o dinheiro para o Brasil, para reformar sua casa. Ele prefere, entretanto, deixar o dinheiro em uma conta lá fora, já que viaja com frequência aos Estados Unidos. Assim, evita pagamento do Imposto sobre Operações Financeiras (IOF) para compra de dólar ou operações com cartão de crédito.
As operações com “stock options” e principalmente o pagamento de impostos sobre elas não são triviais. “No começo pedi ajuda para a empresa, conversei com os recursos humanos”, diz Chaves. Programas de benefícios que envolvem ações são cada vez mais comuns no Brasil, mas os funcionários têm muitas dúvidas sobre o que fazer com elas, segundo Marcos Morales, diretor de remuneração de executivos da consultoria Towers Watson no Brasil.
Em uma pesquisa com 300 empresas que atuam no Brasil, entre nacionais e multinacionais, a Towers Watson identificou que 52% dos presidentes já têm algum mecanismo de incentivo baseado em ações. Considerados também os diretores, esse índice sobe para 60%. Os dados são de setembro de 2011. As multinacionais americanas são líderes nesse tipo de benefício.
O problema, segundo Morales, é que muitas vezes o programa é administrado do exterior, sem passar pela área de recursos humanos do Brasil. “Não é um processo simples, há toda uma burocracia. É fundamental que as empresas tenham processos claros de orientação sobre esses programas, até para evitar que o executivo incorra em evasão fiscal”, diz. Morales sugere que a multinacional prepare uma cartilha, com o auxílio de um advogado que entenda a legislação tributária brasileira.
Além do pagamento de impostos, o empregado precisa tomar uma decisão sobre o que fazer com as ações. Na dúvida, alguns executivos que não precisam do dinheiro no curto prazo acabam acumulando ações. Apesar de confortável, a atitude fere o princípio básico da diversificação. Aqui, o empregado não só concentra os investimentos na mesma cesta, como coloca o próprio emprego lá dentro.
“Aí de repente o mercado dá um espirro e a empresa fecha. O funcionário perde seu emprego e ao mesmo tempo grande parte do seu patrimônio”, diz Aloysio Vasconcellos, presidente da Westchester, consultoria que atua na área de planejamento financeiro internacional em Boca Raton, nos Estados Unidos. Ele cita casos de empregados de instituições financeiras que acumularam ações, principalmente para adiar o pagamento do imposto de renda, e tiveram grandes perdas em crises econômicas.
Também para diversificar os investimentos, Vasconcellos sugere que esses executivos considerem a possibilidade de usar o dinheiro das ações vendidas para reinvestir fora, em vez de entrar com o dinheiro no Brasil. “O executivo já tem emprego, bens e investimentos no Brasil. Vai colocar mais dinheiro no país?”, diz, sugerindo que o empregado ao menos avalie as opções de investimento no exterior.
Para que não seja necessário pagar todos os impostos brasileiros a cada realização de ganhos, Vasconcellos sugere que o executivo abra uma empresa no exterior, em um país que não tribute a renda. O investimento entra na declaração anual na forma de participação societária. Assim, os ganhos são declarados como investimentos em empresa no exterior. Distribuições, como de dividendos, aparecem como reduções de capital. Assim o imposto de renda é postergado e perdas compensam ganhos, já que a tributação só ocorrerá sobre o resultado líquido quando positivo.
Investir fora, entretanto, tem custo. São cerca de US$ 2 mil ao ano para o investidor, o que inclui custos com contador e taxas do governo, segundo Vasconcellos. “Se o investimento for pequeno, não justifica toda essa parafernália”, afirma.
É bom lembrar que deixar de trazer o dinheiro ao Brasil não elimina o pagamento do imposto de renda ao receber o bônus e também ao vender as ações. E, durante todo esse processo, não há moleza com o leão (veja abaixo). Ao oferecer o benefício, a empresa não faz qualquer desconto na fonte. A responsabilidade pelo cálculo e recolhimento é do funcionário e envolve atenção ao longo de todo o ano, não apenas na declaração de ajuste.
Roberto Justo, sócio da Choaib, Paiva e Justo Advogados, recomenda que o benefício seja declarado desde o momento em que é oferecido. “A declaração não é só de bens, é também de direitos, o que inclui o recebimento de ações dentro de um determinado prazo”, diz. Quem deixou de avisar a Receita de algum dos passos deve fazer a retificação.
Andrea Nogueira, sócia da Velloza & Girotto Advogados, lembra que o imposto deve ser recolhido sempre até o último dia útil do mês seguinte ao fechamento da operação. “Existe um tabu de que o ganho apurado no exterior só deve ser pago quando o executivo traz o dinheiro. Pelo contrário, esse passo é irrelevante. Tudo tem que ser pago no momento em que é apurado e auferido”.