Tema: Saber se ocorre prescrição intercorrente em processo administrativo fiscal // aplicação do instituto da denúncia espontânea às infrações administrativas
REsp 2002852 – FAZENDA NACIONAL e SOCIETE AIR FRANCE x OS MESMOS – Relator: Ministro Francisco Falcão
REsp 2120479 – FAZENDA NACIONAL x HELLMANN WORLDWIDE LOGISTICS DO BRASIL LTDA – Relator: Ministro Francisco Falcão
Os ministros da 2ª Turma deverão prosseguir com a apreciação dos recursos especiais que versam sobre prescrição intercorrente em processo administrativo fiscal, bem como sobre a aplicação do instituto da denúncia espontânea às infrações administrativas. Apresentará voto-vista o ministro Afrânio Vilela e não participará da votação o ministro Teodoro Silva, por não estar presente na sessão em que foram realizadas sustentações orais.
O relator compreendeu que a incidência da prescrição intercorrente deve ser analisada a partir da perspectiva do procedimento de imposição da multa e do procedimento administrativo, independentemente da natureza da multa aplicada. Segundo essa visão, por razões pragmáticas, o legislador teria submetido a aplicação da penalidade aduaneira ao processo administrativo fiscal. Há uma previsão expressa no artigo 5º da lei 9874, que trata da prescrição intercorrente e sua inaplicabilidade aos processos e procedimentos de natureza tributária. De acordo com o relator, isso incluiria os procedimentos de natureza fiscal. Ele também entende que o artigo 129 do Decreto-Lei 37/66, semelhante ao artigo 151, III, do CTN, atribui efeito suspensivo às reclamações e recursos cabíveis no contencioso administrativo fiscal envolvendo multa aduaneira. Isso afastaria a incidência da prescrição ordinária e/ou intercorrente durante a discussão administrativa.
De forma divergente, o Ministro Mauro Campbel entendeu que a adoção do rito de procedimento administrativo fiscal não é incompatível com a prescrição intercorrente prevista no §1º do artigo 1º da Lei 9.873/99. Segundo essa lei, a prescrição ocorre no procedimento administrativo paralisado por mais de 3 anos, pendente de julgamento ou despacho. Destacou que está ciente do entendimento consolidado no âmbito do CARF, conforme estabelecido na Súmula 11, que afirma que a prescrição intercorrente não se aplica ao processo administrativo fiscal. No entanto, pelo critério da referida súmula, basta que a penalidade seja aplicada pelo rito do processo administrativo fiscal para afastar a possibilidade de prescrição intercorrente. Contudo, acredita que as penalidades aplicadas no âmbito do processo administrativo fiscal, como as penalidades aduaneiras que podem ter natureza jurídica tributária ou não tributária, devem ser consideradas. Assim, a definição da legislação aplicável em relação à prescrição será determinada pela natureza do crédito perseguido.
Afirmou que a prescrição tem natureza jurídica de direito material, não de direito processual, uma orientação adotada pelo STJ no julgamento do IAC nº 1. Portanto, a prescrição deve seguir os prazos estabelecidos na lei substantiva. Ele ressaltou a importância da distinção entre direito material e direito processual nesse caso, já que a legislação processual do processo administrativo fiscal, definida no Decreto 70.235/72, não prevê prescrição intercorrente. Este decreto é usado para determinar a multa aduaneira em questão. Observou que se a prescrição fosse uma instituição de direito processual, poderia ser argumentado que a simples falta de prescrição intercorrente na legislação que rege o processo administrativo fiscal seria suficiente para eliminar a possibilidade de sua ocorrência. No entanto, ele apontou que a prescrição tem a natureza de um direito material, portanto, a ocorrência deve ser determinada com base na legislação substantiva relacionada ao crédito perseguido no processo administrativo. Assim, a legislação específica da prescrição intercorrente discutida na hipótese dos autos, ou seja, a Lei 9.873/99, declara em seu artigo 1º, §1º que a prescrição se aplica ao procedimento administrativo paralisado por mais de três anos, pendente de julgamento ou despacho. No entanto, o artigo 5º da lei exclui sua aplicação em relação às infrações de natureza funcional e aos processos e procedimentos de natureza tributária.
O ministro Mauro Campbell observou que, nos casos de aplicação de penalidade relativa à obrigação tributária, não há previsão legal de prescrição intercorrente. Isso se deve ao fato de que a prescrição do crédito tributário fica suspensa por conta das reclamações e recursos no processo tributário administrativo, conforme estabelecido no artigo 151, III, do CTN. No entanto, no caso de penalidade de natureza administrativa não tributária, decorrente do exercício do poder de polícia da administração pública federal, a prescrição intercorrente prevista no art. 1º, §1º da lei 9.873/99 se aplica, mesmo que a penalidade seja aplicada no âmbito do processo administrativo fiscal, previsto no Decreto 70.235/72. Portanto, é necessário determinar se a penalidade aplicada tem natureza administrativa ou tributária, decorrente de obrigação principal ou acessória. A multa aplicada pela fiscalização aduaneira, conforme disposto no artigo 107, IV, alínea e do Decreto-Lei 37/66 (por não prestar informação sobre veículo ou carga transportada, ou sobre operações executadas, na forma e no prazo estabelecidos pela Secretaria da Receita Federal, aplicada à empresa de transporte internacional, inclusive a prestadora de serviços de transporte internacional expresso porta-a-porta, ou ao agente de carga), não constitui obrigação tributária principal ou acessória. Deste modo, a prescrição prevista no CTN não seria aplicável, mas sim a prescrição intercorrente à legislação administrativa federal que trata da constituição e cobrança de multas administrativas.
Concluiu que, se o crédito objeto do processo administrativo fiscal ainda pendente de julgamento ou despacho não tiver natureza tributária, haverá prescrição intercorrente se ficar paralisado por mais de 3 anos, conforme o § 1º do art. 1º da Lei 9.873/99. Isso não se aplica se a pendência ocorrer durante a fase de recurso voluntário, abrangida por efeito suspensivo, ou se as exceções previstas no artigo 5º da lei estiverem configuradas.
Na solução do caso concreto relativo ao REsp 2002852 (FAZENDA NACIONAL x SOCIETE AIR FRANCE), consignou que o acórdão recorrido apenas afirmou que “diante da natureza administrativa da infração em questão, é evidente a incidência da prescrição intercorrente prevista no artigo 1º do §1º da Lei 9.873/99, quanto ao débito objeto do processo administrativo”, não sendo possível aferir se a prescrição intercorrente ocorreu na pendência de decisão de primeira instância administrativa ou em fase recursal voluntária, o que não poderia ocorrer na segunda hipótese, em razão do efeito suspensivo. Assim, o ministro Mauro Campbell acompanhou o relator para conhecer em parte e, nesta extensão, negar provimento ao recurso especial do particular e, quanto ao recurso especial da Fazenda Nacional, acompanhou o relator para não conhecer da preliminar de violação ao art. 1022 do CPC e, no mérito, negou provimento ao recurso fazendário.
Em relação ao REsp 2120479 (FAZENDA NACIONAL x HELLMANN WORLDWIDE), deixou de conhecer do recurso, porém, se vencido no conhecimento, adiantou que acompanhará o relator para dar provimento ao recurso especial por fundamentos diversos.
O ministro Herman Benjamin acompanhou o relator em ambos os recursos.
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