Medida Provisória cria novos benefícios fiscais para INR e reduz requisitos de benefícios fiscais para INR cotista de FIP
No dia 22.09.2022, foi publicada no Diário Oficial da União (“DOU”), edição extra, a Medida Provisória nº 1.137, de 21.09.2022 (“MP nº 1.137/2022”), que reduziu a zero a alíquota do Imposto sobre a Renda Retido na Fonte (“IRRF”) em determinadas aplicações financeiras realizadas por investidor residente ou domiciliado no exterior (“INR”) nos mercados financeiro e de capitais brasileiro, bem como alterou o artigo 3º da Lei nº 11.312/2006, que prevê alíquota zero de IRRF sobre os rendimentos e ganhos auferidos por INR em aplicações em Fundos de Investimento em Participações (“FIP”).
A medida buscou reduzir os requisitos necessários para que os rendimentos produzidos por títulos ou valores mobiliários (“TVM”), por fundos de investimento em direitos creditórios (“FIDC”) ou por FIP sejam elegíveis à alíquota zero do IRRF, de modo a aumentar a atratividade desses títulos/aplicações para o investidor estrangeiro, ampliando, assim, o acesso das empresas brasileiras emissoras de tais instrumentos ao capital estrangeiro.
Contudo, a MP também introduziu uma nova restrição, até então não existente, para INR que sejam beneficiários de “Regime Fiscal Privilegiado”, nos termos do artigo 24-A, parágrafo único, da Lei nº 9.430/1996. Anteriormente, as regras fiscais somente restringiam a aplicação dos benefícios fiscais aos INR residentes ou domiciliados em País que não tribute a renda, ou que a tribute a alíquota inferior a 17% (nos termos do artigo 24 da referida Lei nº 9.430/1996 c/c Portaria MF nº 488/2014 – “Paraíso Fiscal”).
Confira a seguir uma breve síntese das mudanças introduzidas pela MP nº 1.137/2022.
I. Alíquota Zero do IRRF para INR em Determinadas Aplicações Financeiras
A MP nº 1.137/2022 reduziu a zero a alíquota do IRRF (“Alíquota Zero IRRF”) incidente sobre os rendimentos pagos, creditados, entregues ou remetidos a INR, quando produzidos por:
(i) títulos ou valores mobiliários (“TVM”) objeto de distribuição pública, de emissão por pessoas jurídicas de direito privado, excluídas as instituições financeiras (“IF”) e demais instituições autorizadas a funcionar pelo Banco Central do Brasil (“BACEN”);
(ii) Fundos de Investimento em Direitos Creditórios (“FIDC”), regulamentados pela Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”), cujo originador ou cedente da carteira de direitos creditórios não seja IF ou instituição autorizada a funcionar pelo BACEN e cujas cotas estejam admitidas à negociação ou registradas em sistema de registro autorizado pelo BACEN ou pela CVM, no âmbito de suas competências; e
(iii) Letras Financeiras, de que trata o artigo 37 da Lei nº 12.249/2010;
(iv) cotas de fundos de investimento que invistam, exclusivamente e em qualquer proporção:
a. nos TVM mencionados no item “i” acima;
b. em ativos que produzam rendimentos isentos ao INR;
c. em títulos públicos federais; e
d. em operações compromissadas lastreadas em títulos públicos federais ou cotas de fundos de investimento que invistam em títulos públicos federais.
Para fins desta Alíquota Zero IRRF, em linha com o conceito de IF já adotado para fins da alíquota zero aplicável aos títulos de que trata o artigo 1º da Lei nº 12431/2011, classifica como IF os bancos de qualquer espécie, as cooperativas de crédito, as caixas econômicas, as sociedades distribuidoras de títulos e valores mobiliários, as sociedades corretoras de câmbio e de títulos e valores mobiliários, as sociedades de crédito, financiamento e investimentos, as sociedades de crédito imobiliário, e as sociedades de arrendamento mercantil.
No que diz respeito ao conceito de “rendimentos”, a MP reproduziu o conceito constante da alínea “a” do § 2º do artigo 81 da Lei nº 8.981/1995, dispondo que estão incluídos neste conceito quaisquer valores que constituam remuneração de capital aplicado, inclusive aquela produzida por títulos de renda variável, tais como juros, prêmios, comissões, ágio e deságio e os resultados positivos auferidos em aplicações em fundos de investimento.
Com relação à aplicação da referida Alíquota Zero IRRF no âmbito dos rendimentos produzidos pelos TVM, FIDC e Letras Financeiras definidos acima, além de a MP nº 1.137/2022 vedar o referido benefício às operações celebradas entre pessoas vinculadas, nos termos do disposto nos incisos I a VI e VIII do caput do artigo 23 da Lei nº 9.430/1996, vale salientar que a grande inovação concerne à vedação expressa à aplicação da Alíquota Zero IRRF ao INR beneficiário de regime fiscal privilegiado (“INR Regime Fiscal Privilegiado”), na forma do artigo 24-A da Lei nº 9.430/1996 (e não apenas ao INR residente ou domiciliado em Paraíso Fiscal).
I.1. Fundos Soberanos
Além disso, a MP nº 1.137/2022 determina, ainda, que a Alíquota Zero IRRF se aplica aos rendimentos auferidos por “Fundos Soberanos” que realizem operações financeiras no Brasil de acordo com as normas e condições estabelecidas pelo Conselho Monetário Nacional (“CMN”), ainda que os referidos Fundos Soberanos sejam domiciliados em Paraíso Fiscal.
Para este fim, a MP nº 1.137/2022 define Fundos Soberanos como veículos de investimento no exterior cujo patrimônio seja composto por recursos provenientes exclusivamente da poupança soberana do país respectivo.
Quanto a este ponto, vale lembrar que, mesmo anteriormente à publicação da MP nº 1.137/2022, os Fundos Soberanos que realizam operações financeiras no Brasil de acordo com as normas e condições estabelecidas pelo CMN, inclusive quando residentes em Paraíso Fiscal, já se beneficiavam de alíquota zero do IRRF sobre os rendimentos decorrentes de determinados títulos e valores mobiliários e cotas de FIDC, nos termos previstos no artigo 1º da Lei nº 12.431/2014. Contudo, a Receita Federal (por meio da IN RFB nº 1585/2015, artigo 92, parágrafo 15) manifestou sua interpretação no sentido de que, particularmente para fins dessa alíquota zero, somente devem ser entendidos como Fundos Soberanos os veículos de investimento no exterior cujo patrimônio seja composto por recursos provenientes exclusivamente da poupança soberana do país respectivo (o que também é um requisito para fins da nova Alíquota Zero IRRF trazida pela MP nº 1.137/2022) e que, adicionalmente, cumpram alguns requisitos, a saber: (a) apresentar, em ambiente de acesso público, uma política de propósitos e de investimento definida; (b) apresentar, em ambiente de acesso público e em periodicidade, no mínimo, anual, suas fontes de recursos; e (c) disponibilizar, em ambiente de acesso público, as regras de resgate dos recursos por parte do governo. Estes requisitos adicionais, no entanto, não foram exigidos pela MP nº 1.137/2020 para fins de aplicabilidade da nova Alíquota Zero IRRF aos Fundos Soberanos, sendo a única condição exigida pela referida MP que o Fundo Soberano se enquadre como um veículo de investimento no exterior cujo patrimônio seja composto por recursos provenientes exclusivamente da poupança soberana do país respectivo.
II. Ampliação da Alíquota Zero IRRF aplicável aos FIP para Abarcar também os FIP-IE e FIP-PD&I e Alteração dos Requisitos e Condições para sua Fruição
Como se sabe, anteriormente à publicação da MP nº 1.137/2022, o artigo 3º da Lei nº 11.312/2006 previa uma Alíquota Zero IRRF aos rendimentos e ganhos auferidos por INR em operações com FIP.
Contudo, no que se refere particularmente aos FIP em Infraestrutura (“FIP-IE”) e aos FIP na Produção Econômica Intensiva em Pesquisa, Desenvolvimento e Inovação (“FIP-PD&I”), a Lei que os regulamentou, i.e., a Lei nº 11.478/2007, previa a incidência do IR à alíquota zero apenas sobre os ganhos auferidos por INR na alienação de cotas, enquanto os rendimentos decorrentes desses fundos de investimento sujeitavam-se ao IRRF à alíquota de 15% (ou a uma isenção, quando auferidos por pessoa física, conforme é possível interpretar a partir do artigo 2º, § 3º, da Lei nº 11.478/2007 c/c os artigos 85, §4º, e 88, parágrafo único, da Instrução Normativa RFB nº 1.585/2015).
Com a nova regra trazida pela MP nº 1.137/2022, no entanto, o referido benefício fiscal foi ampliado, de modo a abarcar tanto os ganhos decorrentes da alienação de cotas quanto os rendimentos das cotas dos FIP-IE e dos FIP-PD&I, auferidos por INR quando da distribuição, resgate, inclusive em razão da liquidação do fundo, e/ou amortização de cotas.
II.1. Requisitos e Condições para Fruição da Alíquota Zero IRRF aplicável aos FIP, FIP-IE e FIP PD&I
A nova regra trazida pela referida MP nº 1.137/2022 também trouxe alterações à legislação no que se refere aos requisitos exigidos para a fruição da Alíquota Zero IRRF aplicável aos rendimentos e ganhos decorrentes da aplicação por INR em FIP.
Como se sabe, anteriormente à publicação da MP nº 1.137/2022, a Lei nº 11.312/2006 previa, em seu artigo 2º, parágrafo 4º, que os FIP, para além de observar os limites de diversificação e as regras de investimento constantes da regulamentação estabelecida pela CVM, deveriam ainda ter sua carteira composta por, no mínimo, 67% (sessenta e sete por cento) de ações de sociedades anônimas, debêntures conversíveis em ações e bônus de subscrição para fins de seu enquadramento tributário (“Requisito 67%”).
Além disso, no que se refere à Alíquota Zero IRRF aplicável aos INR que fossem cotistas de FIP, a referida Lei estabelecia que este benefício fiscal:
i. não seria concedido ao cotista INR que fosse titular de cotas que, isoladamente ou em conjunto com pessoas a ele ligadas (conforme definição também dada pela mesma Lei), representasse 40% ou mais da totalidade das cotas emitidas pelo FIP ou cujas cotas, isoladamente ou em conjunto com pessoas a ele ligadas, lhe dessem direito ao recebimento de rendimento superior a 40% do total de rendimentos auferidos pelo FIP (“Requisito 40%”);
ii. não se aplicaria aos FIP que detivessem em suas carteiras, a qualquer tempo, títulos de dívida em percentual superior a 5% de seu patrimônio líquido, ressalvados desse limite os títulos de dívida mencionados no § 4º do art. 2º desta Lei e os títulos públicos (“Requisito Composição da Carteira do FIP”); e
iii. não se aplicaria aos residentes ou domiciliados em Paraíso Fiscal (“Requisito Não Paraíso Fiscal”).
Com a publicação da MP nº 1.137/2022, no entanto, foram revogados tanto o Requisito 67% (anteriormente aplicável aos FIP para fins de seu enquadramento tributário em geral) quanto os Requisitos 40% e Composição da Carteira do FIP (anteriormente aplicáveis especificamente para fins da Alíquota Zero IRRF relativa aos cotistas INR), de modo que, com a vigência da referida MP, passa a não ser mais necessária a sua observância para fins de fruição da referida Alíquota Zero IRRF.
Sem prejuízo disso, cabe destacar que, no que se refere ao Requisito Não Paraíso Fiscal, a MP nº 1.137/2022 trouxe uma restrição adicional, limitando a aplicação da Alíquota Zero IRRF em questão aos cotistas INR que não apenas não sejam residentes em Paraíso Fiscal, mas que também não sejam beneficiários de Regime Fiscal Privilegiado.
Isto porque, como se sabe, a Lei nº 11.312/2006, anteriormente à aplicação da MP nº 1.137/2022, não estabelecia vedação no mesmo sentido ao INR beneficiário de Regime Fiscal Privilegiado, mas tão somente àquele domiciliado em Paraíso Fiscal.
III. Produção de Efeitos
A princípio, para produção de efeitos a partir de 01.01.2023, a MP não precisaria ser convertida em lei até o final deste exercício.
No entanto, particularmente no que se refere à Alíquota Zero IRRF aplicável aos cotistas INR de FIP, existe a possibilidade de se interpretar que a MP nº 1.137/2022 estaria indiretamente revogando a Alíquota Zero IRRF anteriormente aplicável aos cotistas INR beneficiários de Regime Fiscal Privilegiado, o que poderia eventualmente ensejar discussão judicial acerca do momento a partir do qual a MP poderia passar a surtir efeitos, em atenção ao Princípios da Anterioridade e da Legalidade Tributária, em consonância com o artigo 150, § 6º da Constituição Federal de 1988 – questão que vem sendo objeto de discussão inclusive no âmbito do STF.
Sem prejuízo disso, vale apontar que a MP nº 1.137/2022 entrou em vigor na data de sua publicação (i.e., 22.09.2022) e com previsão de produzir efeitos a partir de 01.01.2023, devendo ser apreciada pelo Congresso Nacional no período de até 45 (quarenta e cinco) dias após sua publicação, sob pena de trancamento da pauta de votações da casa legislativa em que estiver tramitando (i.e., o denominado regime de urgência); bem como ser convertida em lei dentro de até 60 (sessenta) dias, prorrogáveis por mais 60 (sessenta), também contados a partir de sua publicação (i.e., até, no máximo, 20.01.2023), sob pena de perder sua eficácia.
A equipe de Consultoria Tributária está à disposição para prestar quaisquer esclarecimentos acerca deste tema.
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