Por De São Paulo
Em um mundo ainda muito acostumado à papelada, as assembleias on-line de fundos enfrentam desafios culturais para vingar. É preciso provar que quem está do outro lado do computador é o cotista. Para isso, é necessário conviver com formas mais modernas de representação, para além da tradicional procuração autenticada em cartório. É preciso ainda garantir a confidencialidade dos dados dos cotistas.
“Um ambiente seguro, com controle de autenticação, é até mais forte do que somente a procuração”, diz Patricia Peck Pinheiro, especialista em direito digital, sócia da PPP Advogados.
Em um ofício sobre o uso de serviços on-line por fundos de investimento, divulgado em agosto do ano passado, a CVM menciona a possibilidade de uso de certificado digital privado, ou seja, que não precisa ser emitido por alguma autoridade pública.
Patricia considera que o formato de autenticação não deve ser muito complexo, para que não afaste os cotistas. No caso do certificado digital, defende que não seja exigido do investidor o ICP-Brasil (sigla para Infraestrutura de Chaves Públicas Brasileira) porque isso exigiria um esforço adicional do investidor estrangeiro.
“Tem que haver uma modernização da representação. A legislação foi feita para um mundo em que não existia computação em nuvem, internet ou assinatura eletrônica”, diz Regis Abreu, presidente do comitê de fundos de ações da Anbima.
Outro ponto que causou polêmica na CVM, como ficou claro no processo administrativo de 2010, foi a ameaça ao sigilo dos dados do cotista. Isso porque a autarquia respondia à consulta de uma empresa que deveria ser contratada pelo administrador para oferecer a plataforma virtual. O administrador poderia repassar a relação de cotistas? A CVM considerou que o prestador de serviços pode sim ter acesso aos dados desde que seja assinado um termo de confidencialidade. “Se ele for descumprido, o administrador responde”, diz Graciela Barros, advogada do Velloza & Girotto Advogados.
A CVM afirma, inclusive, que não é necessária a aprovação prévia de cada cotista, mas apenas que eles sejam informados da adoção da assembleia on-line e do compartilhamento de seus dados. “O ideal seria que a possibilidade de utilização de assembleia on-line já aparecesse no regulamento do fundo”, considera Graciela.
À parte todas as polêmicas técnicas, há ainda a dúvida sobre a capacidade da solução virtual para resolver o problema da baixa frequência. “Quem disse que o cotista que não participa fisicamente vai participar no formato on-line? Ainda não existe esse interesse de votar, o investidor não tem essa consciência de participar”, pondera Graciela.
Mauro Rodrigues da Cunha, presidente da Associação de Investidores no Mercado de Capitais (Amec), considera legítimo questionar o absenteísmo em assembleia de fundos. Ele indaga, entretanto, se as assembleias, principalmente nos casos de fundos abertos e com liquidez diária, são tão atraentes para os investidores. “Em última instância, o cotista pode sacar seu dinheiro”, afirma.
Cunha questiona se proteger o cotista não seria mais garantir a ele a publicidade das informações do que a participação nas assembleias. “Poderíamos perguntar se o investidor que opta por um fundo de investimento não estaria querendo se livrar desse tipo de preocupação”, diz. (LS)