Fonte: Valor Econômico
Entrevista com Guilherme Fernandes Cooke, Sócio V&G.
Por Sérgio Tauhata
O capital semente germinou entre 2014 e 2015. E deve frutificar ainda mais no próximo ano. Diversas ações iniciadas ou intensificadas no período têm ajudado a democratizar o acesso de pequenos investidores às “startups”, ou seja, empresas iniciantes com alto potencial de crescimento. Conforme especialistas, o conjunto de iniciativas pode significar o nascimento de um ecossistema mais completo do chamado “seed capital”, ou capital semente, que são os recursos voltados a apoiar projetos inovadores em seus primeiros passos.
“Estamos assistindo a um momento raro, no qual esforços regulatórios e de agentes do mercado têm sido combinados para tornar muito mais facilitado o acesso de investidores às participações em empresas iniciantes inovadoras”, afirma Guilherme Cooke, sócio do escritório Velloza e Girotto. Entre as novidades recentes, o advogado especializado no mercado de capitais cita a sinalização pela Comissão de Valores Mobiliários (CVM) de que deve viabilizar em breve o Fundo de Investimento em Participações (FIP) Seed Capital, uma nova modalidade de FIP com custos menores, regras mais flexíveis e foco no investimento em startups.
Segundo a Associação Brasileira de Private Equity e Venture Capital (ABVCAP), a expectativa é que ainda neste ano a minuta de instrução de reforma dos FIPs, que deve criar a nova categoria, seja colocada em audiência pública pela CVM. E a entidade espera que até o fim do primeiro semestre de 2016 a nova instrução já esteja em vigor.
O FIP Seed Capital, conforme tem sido discutido com o mercado, teria descontos regulatórios para diminuir custos de funcionamento e adotaria regras mais flexíveis. Poderia, por exemplo, investir em sociedades limitadas, o que não pode ser feito pelos FIPs tradicionais, com alocação restrita a participações em SAs. Esse tipo de fundo seria também dispensado das exigências de governança para empresas que recebem recursos. São condições essenciais para a carteira manter o foco nas startups, que são organizações de pequeno porte e, portanto, sem estrutura para manter órgãos como um conselho de administração ou fazer auditoria independente em intervalos regulares.
Para Luis Eugenio Figueiredo, vice-presidente da ABVCAP, o FIP Seed Capital viria para complementar outras modalidades de investimento em empresas no chamado “early stage” (estágio inicial, na tradução do inglês). De acordo com o executivo, a estrutura de fundos atrairia pessoas que desejam investir em startups, mas não têm conhecimento ou tempo para avaliar e ajudar no desenvolvimento do negócio, como ocorre no investimento anjo. “Usar um gestor de capital semente é interessante porque o gestor acaba agregando sua ‘expertise’ e esse valor adicional às empresas e o investidor pode ficar numa posição passiva ou mesmo ter uma interação muito pontual com as investidas”, afirma.
Em outra frente, a Finep, órgão de fomento à inovação vinculado ao Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação, e a associação Anjos do Brasil, que reúne redes de investidores-anjo no país, anunciaram no fim de outubro uma parceria para viabilizar fundos de capital semente. A previsão é de aporte de R$ 80 milhões até 2017, distribuídos em quatro Fundos Startup, como foram batizados os FIPs que serão constituídos para a empreitada.
A novidade fica por conta do formato. Inspirado nos fundos de coparticipação existentes na Europa, nos quais governo e investidores-anjo, ou seja, pessoas físicas que usam recursos próprios para apoiar empresas nascentes, fazem aportes conjuntos em projetos inovadores, os Fundos Startup só vão investir em projetos apresentados por investidores-anjos, que também devem adquirir participação no negócio.
Além da parceria com a Finep, o esforço de fomento por parte da Anjos do Brasil levou a uma verdadeira multiplicação de redes de anjos: em 2015, o segmento conta com seis vezes mais grupos do gênero em relação a 2011, quando a entidade foi criada. Essa estrutura, semelhante a clubes de investimento, permite aos participantes pulverizar os aportes, diminuir o valor individual disponibilizado e atrair mais interessados.
“Com mais gente investindo, além de a pessoa poder dividir seu capital entre vários investimentos, também se beneficia de um risco diluído”, afirma Cassio Spina, presidente da Anjos do Brasil. Conforme estimativa da entidade, o investimento em startups por pessoas físicas pode alcançar mais de R$ 1 bilhão neste ano e deve manter o crescimento na casa de dois dígitos, registrado desde 2010.
Entre os agentes do ecossistema de capital semente que despontaram nos últimos dois anos estão as aceleradoras. Esse tipo de organização, além de capacitar os empreendedores e fornecer estrutura física, faz o primeiro investimento na empresa ou ideia, em geral, com uma combinação de recursos próprios e de investidores-anjo. Conforme a Associação Brasileira de Startups, 39 aceleradoras foram criadas entre 2011 e 2014, mas só o ano passado concentra 25% desses lançamentos. A expansão acelerada levou o segmento, no fim de 2014, a criar uma entidade representativa, a Associação Brasileira de Empresas Aceleradoras de Inovação e Investimento (Abraii).
Uma das principais novidades no território do capital semente começou a existir em 2014, mas deslanchou mesmo ao longo de 2015. Trata-se do “equity crowdfunding”, uma modalidade de investimento coletivo on-line, por meio da qual pessoas físicas podem aportar recursos em startups. Em troca ganham o direito de ficar sócios do negócio após determinado período. Em um ano, as plataformas conseguiram captar mais de R$ 5 milhões para cerca de 15 empresas iniciantes.