Fonte: Valor Econômico
Entrevista com Dr. Luiz Girotto, Sócio V&G.
No ano passado, quando a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) identificou os primeiros processos de bancos contestando a cobrança da Cofins em tramitação no Supremo Tribunal Federal (STF), chegou-se a classificar as instituições como “franco atiradoras”. Mas, ao contrário do que se pensava, os casos existentes não eram isolados. Agora, a contestação judicial das instituições financeiras ganhou atenção especial da Federação Brasileira de Bancos (Febraban), que está monitorando os casos já existentes para garantir um bom encaminhamento às ações na Justiça. Isso porque elas podem fixar os primeiros precedentes do Supremo sobre o tema e, assim, definir a tributação de todo o setor financeiro.
A decisão da Justiça quanto à incidência da Cofins sobre o spread bancário, e também sobre os prêmios pagos às seguradoras, entrou definitivamente na agenda do setor financeiro quando o Supremo começou a discutir o projeto de elaboração de uma súmula vinculante sobre o alargamento da base de cálculo da Cofins – promovido pela Lei nº 9.718, de 1998, e considerado inconstitucional pela corte em 2005. A proposta recebida pelo ministro Marco Aurélio de Mello abria as portas à incidência do tributo sobre a receita financeira das instituições financeiras, o que levou os advogados dos bancos a começarem a agir. A votação do projeto de súmula vinculante sobre a Cofins acabou adiada, mas agora, sob a tutela da Febraban, um pequeno grupo de advogados tributaristas monta a estratégia de defesa dos bancos e acompanha o andamento dos processos candidatos a “leading case” no Supremo.
Hoje, segundo um levantamento feito pela Febraban, existem em tramitação no Supremo apenas dez processos de bancos contestando a incidência da Cofins sobre suas receitas financeiras – todos de instituições de menor porte. Segundo Carlos Pelá, coordenador da subcomissão da Febraban responsável pelo caso, fatalmente ocorrerá um julgamento de algum processo envolvendo a cobrança da Cofins dos bancos no Supremo, e o resultado acabará impactando as ações judiciais de bancos maiores, ainda tramitando nas primeiras instâncias da Justiça Federal. De acordo com Pelá, a maior parte das contestações judiciais só apareceu depois de 2005, quando o Supremo definiu sua posição sobre o alargamento da base de cálculo da Cofins e afastou a incidência do tributo sobre receitas financeiras. Até então, os tribunais regionais federais (TRFs) eram contrários à tese dos contribuintes.
Escalado para acompanhar a disputa, o advogado Luiz Girotto, do escritório Velloza Girotto Advogados, afirma que a briga não era tão restrita assim. Com exceção dos bancos públicos – o Banco do Brasil e a Caixa Econômica Federal (CEF) -, todas as grandes instituições financeiras do país já têm ações judiciais sobre o assunto há alguns anos. Em 1999, quando entrou em vigor a Lei nº 9.718, que ampliou a base de cálculo da Cofins, dois dos três maiores bancos do país já questionaram a cobrança do tributo. A partir de maio de 2005, quando o Supremo iniciou o julgamento sobre a constitucionalidade da lei, com cinco votos a favor do contribuinte e apenas um favorável à Fazenda, a tese pareceu consolidada e os outros cinco grandes bancos entraram na disputa. A preocupação, diz o advogado, era esperar demais e acabar perdendo créditos mais antigos em função da prescrição.
Segundo Girotto, até pouco tempo atrás a falta de atenção ao tema permitiu que diversos processos de instituições financeiras fossem bem-sucedidos no Supremo. Ele afirma ter cinco ações transitadas em julgado na corte – de corretoras, seguradoras e um de banco -, simplesmente porque a Fazenda não recorreu das decisões. Com a decisão definitiva do pleno do Supremo em dezembro de 2005 fixando a impossibilidade da incidência da Cofins sobre receitas financeiras, os ministros passaram a aplicar, em decisões monocráticas, o precedente a todos os demais casos indiscriminadamente, incluindo as ações das instituições financeiras. Segundo Girotto, mais tarde a Fazenda se deu conta do problema e decisões do tipo já não são possíveis. A informação da PGFN é de que a maioria dos processos já está suspensa no aguardo do pronunciamento do pleno da corte.
Para Girotto, há duas discussões jurídicas a serem analisadas pelo Supremo. Uma delas é que, para as instituições financeiras, não há base legal na tributação dos bancos, seguradoras e corretoras. Isto porque, uma vez que a Lei nº 9.718 foi declarada inconstitucional, o governo precisaria elaborar e aprovar outra lei para tributar o setor. A segunda questão é a classificação do spread bancário como um tipo de serviço, e portanto tributável. Para aprovar esta tese, diz Girotto, o Supremo teria que passar por cima de toda a doutrina, jurisprudência e legislação existente sobre o assunto. Há uma decisão do próprio Supremo, proferida nos anos 80, que afasta a incidência do Imposto Sobre Serviços (ISS) sobre os prêmios pagos a seguradoras, endossando a tese de que este tipo de atividade não é prestação de serviço.