Fonte: Valor Econômico
Entrevista com Dr. Fabrício Parzanese dos Reis , Sócio V&G.
Adriana Aguiar e Laura Ignacio, de São Paulo
Os contribuintes que cogitavam desistir de ações judiciais para incluir os valores discutidos no “Refis da Crise” e se beneficiar das vantagens do programa de parcelamento de tributos federais, começam a rever a possibilidade. O motivo é a Portaria Conjunta nº 10, da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) e da Receita Federal, publicada ontem, no Diário Oficial da União.
O texto regulamentou de forma mais detalhada a conversão dos depósitos judiciais – valores oferecidos pelos contribuintes em garantia nas ações fiscais – para o Refis. A norma esclareceu que só terão direito aos descontos previstos em lei, os que depositaram judicialmente, além do valor principal, multas e juros. Os contribuintes têm até 30 de dezembro para decidir de quais ações desistirão, prazo estipulado pela portaria.
Nesse sentido, se uma ação judicial tem origem em uma autuação, na qual houve a incidência de multa e juros nos valores depositados, haverá os descontos previstos no Refis. No entanto, nos casos em que o contribuinte levou a questão ao Judiciário, sem autuação, e depositou apenas o valor principal da cobrança, não haverá qualquer redução. O mesmo tratamento vale para decisões definitivas, tanto judiciais quanto administrativas.
Com a regra fixada pela portaria, deixa de ser vantajoso desistir de ações que só tenham como depósito judicial o valor principal, segundo advogados. “Ainda que o contribuinte tenha chances remotas de ganhar a ação, não haverá nenhum benefício caso ele desista”, afirma Eduardo Kiralyhegy, do Negreiro, Medeiros & Kiralyhegy Advogados. “Hoje, recebemos mais de vinte ligações de clientes que cogitam abrir mão da adesão ao Refis por causa disso”, afirma o advogado Fabrício Parzanese dos Reis, sócio do Velloza, Girotto e Lindenbojm Advogados Associados. Já para o advogado Glaucio Pellegrino Grottoli, do Peixoto e Cury Advogados, a única vantagem de incluir esses valores no Refis seria deixar de possuir litígios com o fisco. “Mas isso deve ser estudado caso a caso”.
A conversão ao parcelamento, porém, pode ser benéfica quando há depósito dos juros de mora e multa. É o caso assessorado pelo advogado Luiz Rogério Sawaya Batista, do escritório Nunes , Sawaya, Nusman e Thevenard Advogados. Ele tem um cliente que foi autuado e executado pelo fisco. Para garantir a dívida, a empresa foi penhorada e resolveu depositar o dinheiro em juízo, que hoje soma R$ 550 mil. Com a portaria, ficou claro que ela poderá incluir no Refis o valor da época do depósito. Como pretende fazer o pagamento à vista, terá 45% de desconto nos juros de mora e 100% na multa.
Para esses casos, ao aplicar as reduções, o destino do saldo remanescente poderá ficar a critério do contribuinte. O advogado Marcelo Annunziata, do escritório Demarest & Almeida, exemplifica que se uma empresa tem um débito de PIS e Cofins, pode parcelar isso em 180 meses e usar o depósito judicial para pagar outro débito. Se houver sobra, pode ficar com ela.
Mas, no que se refere ao uso de depósitos judiciais de decisões definitivas, a portaria nº 10 é ilegal para alguns advogados. A norma determina que se já tiver sido proferida decisão final, judicial ou administrativa, e o contribuinte não desistiu do processo antes, não tem direito às reduções do Refis. Para a advogada Valdirene Franhani Lopes, do escritório Braga & Marafon, a imposição não consta na Lei nº 11.941. “Além disso, o Código Tributário Nacional prevê que o débito só se extingue após a conversão do valor depositado para os cofres da União”, diz. Uma empresa do ramo de bebidas, cliente de Valdirene, possui R$ 330 milhões nessa situação.
O diretor do departamento de gestão da dívida ativa da União, órgão da PGFN, Paulo Ricardo de Souza Cardoso, esclareceu ao Valor que o governo não poderia permitir a aplicação das reduções do Refis sobre a correção dos depósitos judiciais como especularam alguns advogados. Isso porque a Lei nº 11.941 restringe o benefício a juros e multa. Cardoso explicou também que, caso o governo autorizasse a inclusão no Refis de valores depositados em ação julgada definitivamente, estaria deixando de cumprir decisão judicial. “Ambas atitudes seriam ilegais”, diz.