Soluções em planejamentos patrimoniais e sucessórios

21 . 09 . 2020

Por Bruno Barbosa de Souza, Joanna Rezende e Natalia Zimmermann do Velloza Advogados

A pandemia de Covid-19, aliada às incertezas quanto ao futuro das regras tributárias, à crise econômica e às configurações familiares cada vez mais plurais e multijurisdicionais, gerou nos últimos meses um aumento significativo da busca por planejamento patrimonial e sucessório no Brasil. O objetivo das famílias é maximizar os resultados da estrutura patrimonial e equalizar ou mitigar os conflitos dentro e fora desses núcleos afetivos.

Não raro nos deparamos com questões até então incomuns, como incapacidade de pessoas jovens, mudanças de domicílio fiscal, filiação socioafetiva, famílias plurais e homoafetivas, casamentos, uniões estáveis, divórcios, falecimentos com elementos de conexão em diversas jurisdições, entre outros.Tendo em vista o momento peculiar, é muito importante planejar. Planejamentos consistem em mapear a situação familiar e patrimonial e organizá-la da forma mais eficiente possível, de modo que os desejos e valores familiares sejam preservados, visando evitar conflitos e dilapidação de bens e ativos.

A maior dificuldade encontrada é como organizar o patrimônio e tentar viabilizar uma sucessão célere, pacífica, com o intuito de mitigar conflitos. Assim, apresentamos abaixo brevíssimas ponderações que devem ser feitas sobre cada categoria de ativos que podem vir a compor uma massa patrimonial da família.

Organização do Patrimônio

Para os ativos financeiros, é necessário avaliar a destinação e suficiência para suportar encargos inerentes ao falecimento de um familiar, como os tributários e de inventário e partilha. Neste sentido, os planos de previdência privada (PGBL ou VGBL) ou seguro puro são de enorme valia.

Pensando em imóveis, é importante avaliar quais serão de uso da família e quais terão destinação comercial. As holdings imobiliárias são instrumentos muito interessantes para evitar condomínios imobiliários e facilitar a transferência dos ativos quando do falecimento dos seus titulares. Lembrando que condomínios imobiliários podem intensificar eventuais conflitos familiares em função da restrição aos condôminos da livre administração.

Sobre o patrimônio societário, é necessário avaliar quais as intenções da família com estes ativos. Mais do que nunca temos visto a implementação de regras de governança corporativa por acordos de acionistas/cotistas e protocolos familiares que, se feitos de maneira bem estruturada e dialogada na família, podem facilitar perpetuidade do patrimônio por gerações. Há bastante discussão neste momento sobre a conveniência da utilização de holdings, em função da potencial alteração tributária que seria causada por eventual revogação da isenção sobre distribuição de dividendos. Outro motivo de dúvidas é se uma nova lei poderia gerar tributação em cadeia e, caso isso venha a ocorrer, qual seria a possibilidade de se reestruturar a fim de desmontar as eventuais holdings existentes. Em nossa visão, ainda é cedo para dizer com certeza se haverá tributação em cascata, mas não acreditamos que virá. Além disso, caso venha a ocorrer, será necessário avaliar os prós e contras da estrutura, pois o ganho muitas vezes pode ser maior que o revés tributário.

Para ativos no exterior, sugerimos um planejamento com apoio de um assessor do local em que os ativos estão situados, cabendo questioná-lo sobre qual a melhor forma para programar a sucessão naquele país. A partir daí, deve-se avaliar as possibilidades existentes, tais como elaboração de testamento exclusivo para os ativos no exterior, estabelecimento de joint tenancy with the right of survivorship nos certificados de ações da companhia (a par da discussão de uma eventual caracterização de doação neste momento), ou criação de um trust, caso existam peculiaridades que justifiquem sua implementação, não obstante todas as obscuridades referentes à tributação e outros impactos no Brasil.

No Brasil vigora o princípio da pluralidade dos juízos sucessórios, segundo o qual, havendo patrimônio em diferentes países, deverão ser inventariados estes bens em cada uma destas jurisdições. Assim, bens sitos no exterior escapam ao processo de inventário e partilha no Brasil, devendo ser respeitada a regra sucessória do último domicílio do falecido. Tendo em vista as dificuldades e os conflitos potencialmente causados por processos de inventário, a doação tem sido um dos principais instrumentos utilizados no planejamento sucessório. Nesse contexto, é possível que o doador estabeleça encargos para o donatário, imponha cláusulas restritivas, tais como a incomunicabilidade, impenhorabilidade, inalienabilidade, reversão e, a depender do caso, retenha para si o usufruto dos bens.

Para aqueles casos em que a transferência em vida não for uma possibilidade adequada (ainda que matriarcas e patriarcas permaneçam com o usufruto), temos visto um aumento na demanda pela elaboração de testamentos. É um dos instrumentos mais eficientes para se planejar a sucessão patrimonial, satisfazendo as prioridades de segurança, sigilo e preservação da vontade do testador, que pode beneficiar pessoas que não apenas os herdeiros legítimos, gravar encargos sobre parte de sua herança, estabelecer tutores, curadores especiais de patrimônio para filhos menores, inventariantes, testamenteiros e, ainda, definir como gostaria que a partilha dos seus bens fosse efetuada. Este instrumento deve ser elaborado mantendo o viés da divisão cômoda dos bens.  Os planejamentos também devem ser avaliados sob a ótica dos tributos que impactam as pessoas físicas no Brasil em um primeiro momento, como por exemplo o Imposto de Renda das Pessoas Física (IRPF), o Imposto de Transmissão Causa Mortis e Doação (ITCMD) e o Imposto de Transmissão de Bens Imóveis Inter-Vivos (ITBI).

A pandemia do novo coronavírus trouxe à tona a percepção, muitas vezes adormecida, de que os membros da família devem encontrar formas de se proteger e minimizar os impactos negativos de eventual ausência. Valores ligados ao bem-estar da família e de seus membros se tornaram ainda mais presentes nessas reflexões. Nesse contexto, um planejamento patrimonial, sucessório e tributário elaborado de acordo com as particularidades de cada família e amplamente discutido facilita a sucessão patrimonial, bem como a continuidade dos negócios familiares e a perpetuidade do legado familiar, evitando-se eventuais discussões judiciais sobre a partilha de bens da herança, confrontos familiares e agilizando o processo sucessório. Além de sua implementação, é de grande importância que este planejamento seja reavaliado periodicamente, pois os interesses, configuração familiar e patrimonial, a legislação e a jurisprudência estão em constante evolução e isso pode afetar a exequibilidade do que foi planejado originalmente.

Fonte: https://analise.com/opiniao/solucoes-em-planejamentos-patrimoniais-e-sucessorios