CVM autoriza o investimento indireto em criptomoedas pelos fundos de investimento regulados pela Instrução CVM nº 555/14
21 de setembro de 2018
Na última quarta-feira (19/09), a Comissão de Valores Mobiliários (“CVM”) publicou o Ofício Circular nº 11/2018/CVM/SIN, que teve como escopo principal a definição de requisitos para possibilitar o investimento indireto em criptoativos pelos fundos de investimento regulados pela Instrução CVM nº 555/14.
Com a expansão da negociação das denominadas criptomoedas ou criptoativos, a CVM tinha anunciado ao mercado, no dia 12 de janeiro de 2018, por meio do Ofício Circular nº 1/2018/CVM/SIN, que os fundos de investimento regulados pela Instrução CVM nº 555/14 não poderiam aplicar diretamente seus recursos nessa modalidade de investimento pelo fato de que, conforme interpretação da área técnica da autarquia, as criptomoedas não seriam qualificadas como ativos financeiros.
Entretanto, permanecia como objeto de avaliação pela CVM a possibilidade de constituição e estruturação do investimento indireto em criptomoedas, cuja discussão foi encerrada com a recente publicação de Ofício Circular.
O argumento principal defendido pela autarquia para possibilitar essa modalidade de investimento está presente no artigo 98 e seguintes da Instrução CVM nº 555/14, que tratam de investimento no exterior. Segundo a CVM, a Instrução CVM nº 555/14 “autoriza o investimento indireto em criptoativos por meio, por exemplo, da aquisição de cotas de fundos e derivativos, entre outros ativos negociados em terceiras jurisdições, desde que admitidos e regulamentados naqueles mercados”.
Diligências que deverão ser observadas no investimento em criptoativos
A CVM alertou sobre a necessidade de atendimento às regras de combate e prevenção à lavagem de dinheiro, reconhecendo como uma das formas adequadas a negociação por meio das plataformas (“exchanges”) submetidas à supervisão de órgãos reguladores que tenham poderes para inibir práticas ilegais, como por exemplo, lavagem de dinheiro, operações fraudulentas, ataques de hackers e manipulação de preços, sem prejuízo de buscas por soluções robustas de custódias disponíveis nesse mercado.
Para os criptoativos que representam outros ativos, denominados “criptoativos representativos”, o gestor deverá providenciar, em razão da concentração de risco por emissor, uma due diligence sobre o emissor, além de análise de risco e avaliação quanto à caracterização do criptoativo como valor mobiliário e, se positivo, a existência de eventual registro prévio exigido.
O administrador e o gestor deverão avaliar se o gestor do fundo investido no exterior adota práticas e medidas de mitigação de risco equivalentes às que o gestor do fundo investidor tomaria em sua posição.
Ainda no âmbito do dever de diligência, o gestor deve estar atento às regras de governança aplicáveis ao criptoativo adquirido, de forma a se cientificar, precificar e monitorar eventuais riscos adicionais da aquisição (e.g., a possibilidade de distribuições não equitativas, manipulações ou mesmo limitações à liquidez de negociação).
Por fim, a CVM ressaltou a necessidade de evidenciar, nos documentos dos fundos, os riscos advindos do investimento em criptoativos, além das políticas que serão adotadas pelo administrador e pelo gestor em relação aos eventos com determinados criptoativos que trazem aos investidores o risco destes virem a contar com outros criptoativos, como acontece nas operações conhecidas como forks ou airdrops, que ramificam a estrutura original de um criptoativo, dando origem a outro.
Auditor Independente
Em relação aos auditores independentes regulados pela Instrução CVM nº 555/14, a CVM estabeleceu que estes deverão ser capazes de conduzir as diligências adequadas e proporcionais em relação aos criptoativos detidos pelos fundos de investimento investidos, de forma que caberá ao administrador o dever de diligenciar para que o fundo contrate um auditor capacitado e estruturado para tal função.
A CVM, mais uma vez, explicita que o dever de diligência na contratação de prestador de serviço vai além de verificar meramente a sua autorização: é necessário que o auditor independente, além de autorizado pela autarquia, esteja tecnicamente capacitado a conduzir uma auditoria envolvendo criptoativos.
Liquidez e método de avaliação dos criptoativos
É importante ressaltar a preocupação da CVM com a precificação dos ativos a valor justo, especialmente quando se trata de alternativas menos líquidas, que podem ensejar a transferência indevida de riqueza entre os cotistas do fundo, sobretudo nos fundos de condomínio aberto.
Nesse sentido, estabeleceu que os investimentos deverão ser selecionados observando a liquidez do criptoativo, para que esta seja compatível com as necessidades de precificação periódica dos fundos de investimento, mesmo que não haja um modelo internacionalmente aceito para a precificação, a valor justo, do criptoativo.
Regulamentação de criptoativos no Brasil
Atualmente, tramita na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei 2.303, apresentado em 08 de julho de 2015, que versa, dentre outros assuntos, sobre a regularização da utilização de moedas virtuais nos mercados financeiro e de capitais brasileiros, não sendo possível, ainda, estimar um prazo para sua conclusão.
O Ofício Circular expedido pela CVM demonstra o seu reconhecimento do crescimento e da relevância do mercado de criptoativos. A Comissão optou por indiretamente admitir esta espécie de negociação no mercado regulado, trazendo níveis de proteção e diligência bastante rigorosos para investimento neste tipo de ativo.
Os desafios estipulados pela CVM em relação à profundidade da diligência necessária para aquisição de cotas dos fundos que investem em cripoativos são grandes, principalmente aqueles que se referem à prevenção de lavagem de dinheiro (PLD). Porém, tendo em vista o ânimo do mercado em investir em criptoativos, acreditamos que os métodos necessários para superar tais desafios não demorarão a se estabelecer.
A equipe de Mercado de Capitais do Velloza, com sólida e consistente experiência em fundos de investimento, fica à disposição para esclarecer eventuais dúvidas dos nossos clientes e parceiros.